terça-feira, outubro 13, 2015

Maiorias

Antigamente haviam umas colecções de cromos de jogadores de futebol (nesse tempo os cromos não incluíam os árbitros como agora sugere o Bruno de Carvalho), o rebuçado era de caramelo e vinham dentro de uma lata, quem comprasse o último cromo, cujo embrulho estava colado no fundo da lata levava como prémio uma bola de cabedal, um artigo de luxo na época, o equivalente a ter uma bicicleta.

Pela forma como a direita fala em vitória eleitoral até nos esquecemos de que as eleições serviram para eleger deputados de um parlamento e que seja qual for o governo tem de ser apoiado ou, pelo menos, não merecer a rejeição da maioria desses deputados. Para a direita não está em causa a escolha dos deputados do parlamento que ou não contam ou são unas bananas que só servem para dizer ámen ao governo. A direita foi comprou mais cromos porque queria ficar com o cromo que dava direito à bola de cabedal. Não importa se comprou metade dos cromos ou apenas um terço, se foi quem comprou mais tem direito à bola e cabe ao dono da bola mandar no jogo.

Multiplicam-se os argumentos em favor de um governo minoritário da direita e não faltam personalidades da direita a chamar a atenção do PS para a sua história de conflitos com o PCP. Mas onde estavam essas personalidades bem pensantes da direita portuguesa quando este governo ultrapassou todas as linhas do aceitável? A verdade é que este governo foi tão extremista como o foi o PCP no tempo da manifestação na Fonte Luminosa por tantos recordada nestes dias.
  
Onde estavam estas personalidades quando o governo contava com uma maioria absoluta e promovia um consenso que consistia na mera concordância cega e incondicional com as suas políticas? Onde estava esta boa gente quando o governo escolheu os funcionários públicos para nele e por uma questão de ódio de Passos Coelho concentrar quase toda a austeridade? Onde estavam os Bonifácios e a Bonifácias quando o governo adoptava sucessivas medidas em desrespeito com a Constituição? Onde estavam toda esta gente cheia de vontade de dialogar quando o governo adoptava medidas extremistas escudadas em supostas revisões do memorando?

O governo ultrapassou todas as linhas vermelhas colocando-se uma posição extremista, este governo nada tem de social-democrata, de democrata cristão ou mesmo de neo-liberal, este é um governo que resulta da mistura de Tatcher com Pinochet, há mais semelhanças entre a sua política económica e a do governo de Pinochet do que com a política de qualquer país europeu. Que autoridade moral têm os que se calaram durante este PREC da direita para agora recordarem ou recearem um PREC da esquerda?

É divertido ver tanta personalidade de direita encomendando o inferno a António Costa por ser governo à custa daquilo que cheios de raiva designa por maioria negativa, esquecem-se do tempo em que chegaram ao poder graças a uma maioria negativa em que Passos Votou com Jerónimo e a Catarina se juntou a Portas. os mesmos que agora excluem o PCP e o BE dos jogos de poder são aqueles que chegaram ao poder graças ao voto parlamentar do PCP e do BE. Os mesmos que durante a camopanha eleitoral elogiavam a Catarina Martins de manhã, à tarde e à noite na esperança dos eleitores do PS optarem por votar no BE dizem agora que a rapariga tem sarna.

Ainda é cedo para se saber qual a solução de governo que vai sair deste processo, mas estes têm sido dos dias mais ricos da vida política portuguesa e tem ajudados os portugueses a conheceem melhor o seu presidente, a coragem do seu primeiro-ministro, a honestidade dos seus comentadores e jornalistas e os jogos de interesses que envolvem muitas personalidades.